quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Recantos de São Jorge

Alguns lugares na Vila de São jorge podem ser considerados como pequenas relíquias. E olha que eu, com certeza, não conheci todos. Abaixo, alguns dos encantos da vila.

Camping Taiuá

Não é porque eu fiquei lá (é também, claro) mas eu nunca vi um camping tão bem estruturado. O Taiuá, como quase todos os espaços da Vila de São Jorge, é cercado por um muro de bambu. Ao entrar é possível ver a cozinha comunitária, os banheiros e um grande espaço para colocar as barracas, já quase todo ocupado pelos visitantes. Um camping normal pararia por aí, mas o Taiuá tem alguns espaços que chamam a atenção.

(Conhecidos como "tilelês" ou "hippies", o que as pessoas que se passam a semana em São Jorge verdadeiramente querem é não ter pressa de acabar)

Um deles é a estrutura elevada de madeira, bem no meio de tudo. É como uma casa na árvore, mas sem paredes ou teto. Quem chega primeiro pode simplesmente se sentir ali para aproveitar por um tempo ou pegar o travesseiro e dormir, ao luar. Outro lugar bacana é a tenda mística, um espaço amplo cercado por quatro estacas de madeira unidas na ponta e que cobrem o local com um tecido furado, como aqueles em que se usam nos apanhadores de sonhos. No meio, um grande cristal e espaço com folga para três colchões.

Ainda assim, parte mais legal do camping é o espaço para pequenos shows e apresentações. Na frente, um palco, a direita, uma fogueira, e a esquerda uma estrutura de madeira. No meio, pufs e almofadas coloridas para quem quiser sentar e aproveitar a programação (uma das melhores da vila). Tem gente fica no Taiuá e sequer sai dali. Também, nem precisa.

Lanchonete do café da manhã

(O pão de abóbora feito pelos habitantes da vila é vendido em algumas lojas)

Dessa vez eu vou dever o nome... mas não tem erro: procure uma casa com cercas brancas e paredes vermelhas e você vai estar no lugar certo. O café da manhã por lá é divino. Com 12 reais é possível comer a vontade (o que inclui frutas, pães, bolos e quitutes). Quem prefere comer um pouco menos pode pagar 5 reais e pedir um misto quente feito com pão de abóbora, preparado pelas próprias cozinhas.

Santo Cerrado Risoteria

(Dica: a risoteria é o melhor ponto da vila para se ver o pôr do sol)

Ao contrário da maior parte dos espaços de São jorge, que se transformaram com o tempo, o Santo Cerrado foi criado para ser um restaurante. A risoteria é uma das construções mais recentes da vila e foi planejada de forma ambientalmente responsável. O cliente pode ficar em qualquer um dos espaços: no quintal, com direito a rede e fogueira, no primeiro andar, no segundo ou até na varanda. A especialidade, claro, risotos.


Lua de São Jorge


Velas encobertas por saco de papelão marcam o caminho até o restaurante Lua de São Jorge. Lá dentro, uma antiga casa que deu espaço a um restaurante com iluminação natural e decoração rústica. Mesas e cadeiras de madeira, lounge com sofás e uma fogueira para cliar o clima. A comida é excelente, apesar de um pouco cara. Mas levando em conta que pagamos não só a alimentação, mas todo o ambiente, achei o preço justo.

(A banda Surf Sessions, de Brasília, animou a noite com surf music, ska, reggae e covers irreverentes de grandes nomes como Beatles e Rollings Stones)

Quando chegamos estava relativamente vazio, mas assim que a banda começou a tocar vimos o espaço encher pouco a pouco. A música saía pelas ruas e chamava quem estava do lado de fora. Ficamos ali até as três da manhã, sem ver o tempo passar e sem sentir vontade de ir embora.

Cavaleiro de Jorge

Pelo que eu ouvi falar, a noitada sempre termina aqui. Quando os bares estão fechando e as outras casas noturnas já pararam de funcionar, o Cavaleiro de Jorge enche de gente em busca de diversão e música boa. O ritmo mais comum por aqui é o forró, mas também há espaço para o baião, a ciranda, a lambada, o samba... enfim, quase tudo.

(Festa até as 5 horas da manhã)

Do lado de fora parece pequeno, mas do lado de dentro é realmente enorme. Além do salão em frente ao palco - com escada para o segundo andar - a casa tem um quintal enorme com uma grande área aberta, mesas, cadeiras e até um altar ao santo que dá nome á vila.

Mais tarde fui descobrir que ela é uma Casa de Cultura criada em 1997 com o objetivo de ser um espaço democrático no qual todo tipo de manifestação cultural e popular poderia se apresentar. Com o tempo, o Cavaleiro de Jorge ganhou apoio da população e respaldo institucional.

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

A joia da Chapada

São Jorge é a joia da Chapada. Escutei essa frase algumas vezes antes de por os pés por lá. Não posso juramentar a afirmação já que não fui em outras cidades e vilarejos locais, mas pelo que vi eu posso dizer que aquilo é uma joia mesmo. Acho que dificilmente encontraria uma vila tão encantadora quanto São Jorge.

(A igrejinha em homenagem ao santo que dá nome à vila)

O mais engraçado daqui é que eu pensei que a vila fosse bonita. Não é. Quem passa por ela sem prestar muita atenção ou sem entender muito bem como ela se estrutura vai achar São Jorge feia. O chão é de areia e pedras, as plantas mais rasteiras são cobertas de poeira e os muros das casas, ora feitos de bambu, ora feitos de cimento, não deixa ninguém ver a vila em si. Mas entre em qualquer uma desses pequenas propriedades. Tudo ali é lindo. As casas são charmosas, os campings super organizados e os jardins muito bem cuidados. E cada lugar desses guarda um item surpresa. O nosso camping, por exemplo, tinha casa na árvore e espaço para lual (com direito a fogueira e tudo).

 (O paraíso na terra)

Para eles, o importante deve ser guardado como um tesouro, escondido dos olhos. É por isso que a decoração mística da lojinha de perfumes fica do lado de dentro e o altar a São Jorge feito na casa de shows só pode ser visto por quem vai até o quintal.

Mais bonita que a cidade são as pessoas. O Ricardo me dizia isso o tempo todo porque ele mesmo não tinha percebido até então. Ele passou 13 anos visitando a Chapada, mas sempre por períodos curtos. Foi quando decidiu ficar 10 dias ininterruptos em São Jorge. Além de conhecer novos lugares, ele conversou com jovens, adultos e idosos, carregou crianças no colo, riu das histórias dos trabalhadores e fez verdadeiros amigos. Isso fez com que ele se sentisse tão responsável por aquele local quanto os próprios integrantes da comunidade. E isso me faz pensar o quão especiais as pessoas da vila podem ser para despertar esse tipo de sentimento em alguém.

(Filipe, uma dessas pessoas iluminadas. Chef de cozinha, estava dando uma de barmen no Lua de São Jorge e fez o melhor drink que já provei na vida)

Depois de uma semana observando aquelas pessoas, acho que entendi um pouco o que as torna diferentes. Todos os habitantes ali têm uma característica que faz todo o resto parecer bobagem: compaixão. Cada um deles se coloca verdadeiramente na pele do outro para entender o que eles estão vivendo, sentindo, pensando, precisando. Isso faz com que cada um cuide do próximo como se fosse alguém da própria família. A vila carrega esse sentimento de compaixão de uma forma tão forte que até os visitantes se sentem abraçados pelos locais e responsáveis por ele.

(fazendo um som em uma das praças da cidade)

São Jorge é um lugar especial por esse conjunto de pequenas (grandes) coisas. No próximo post vou trazer alguns dos recantos mais agradáveis da vila.

terça-feira, 21 de agosto de 2012

Crescer sem se perder

Na minha viagem para Brasília, tive a oportunidade de passar três dias em São Jorge, uma linda vila na Chapada dos Veadeiros. O lugarejo, conhecido carinhosamente com "joia da chapada" faz jus ao seu apelido não só pelas belezas naturais, mas também pelas pessoas, pelo clima, pela cidadela em si.

São Jorge é o tipo do local que a gente quer mostrar para todos os nossos amigos e, ao mesmo tempo, esconder dos estranhos. Eis o ponto. Como garantir um crescimento sustentável? O que é necessário fazer para que o turismo se desenvolva sem que a vila perca suas características locais?

(O turismo vai ter a cara que os turistas quiserem dar. Foto tirada desse link)

Crescer sem se perder. Esse é, na minha opinião, o grande desafio do turismo. Se a beleza de uma cidade é o que ela tem de diferente, desde os seus aspectos arquitetônicos até os mais particulares como tradições regionais, essa característica deve ser conservada. E essa conservação tem de estar em equilíbrio com a divulgação, já que é importante que o turismo se desenvolva pois ele traz renda para a cidade. Mas quanto mais gente divulga e mais gente conhece, mais serviços são necessários para suprir a demanda das pessoas que também querem visitar. Em um dado momento, a cidade passa a servir ao turista e não mais à sua população... e, assim, o estrago está feito.

Fui à São Jorge no primeiro fim de semana do XII Encontro de Culturas Tradicionais da Chapada dos Veadeiros e a vila estava cheia. Sei que aquele era um momento atípico, mas eu não parava de pensar em como era importante que a cidade continuasse sendo ela mesma, que as pessoas continuassem levando a vida que levam e que as manifestações culturais continuassem sendo verdadeiras, e não meras representações para agradar visitantes (como eu).

Essa viagem me fez lembrar de uma conversa que tive sobre o Patio de los Naranjos, uma praça pública que fica dentro da Catedral de Sevilla. Ela era ponto de encontro na cidade e fazia parte do cotidiano dos cidadãos, até ser fechada e convertida em ponto turístico. Para entrar, tem que pagar.

Longe de trazer uma resposta, prefiro deixar aqui uma reflexão. Que tipo de turismo deve ser praticado? E qual é o meu papel como turista nessa história toda?

Semana passada encontrei um texto legal no blog do Turismo Backpacker sobre A influência do turismo backpacker no processo de revitalização em áreas urbanas marginalizadas. O estudo (que você pode ler na íntegra, aqui) mostra como certas práticas e perspectivas, normalmente adotadas pelos turistas com perfil de mochileiros, ajudam essa atividade a se tornar mais sustentável.

"O turismo backpacker caracteriza-se pelo seu estilo de viagem independente, flexível, consciente e econômico; assim, o presente trabalho teve como principal intuito promover uma discussão acerca do turismo mochileiro como um elemento relevante no processo de revitalização de áreas urbanas marginalizadas, considerando que o fenômeno turístico envolve questões que vão além da visita em si, relacionando-se  também com os aspectos socioculturais do local. Tomando como estudo de caso a Praça da República/SP e seu entorno (...). Assim, a pesquisa estuda e sugere reconhecimento de potencial e, inserção maior do público mochileiro no local, com intuito de revitalizações sócio-culturais. Buscou-se por fim, elucidar ações necessárias para promover uma interação maior entre os atributos estudados, podendo contribuir para estudos futuros ligados à revitalização de áreas visitadas por este público" - Resumo, página 8

O turismo backpacker ainda é cheio de preconceitos. Muitos associam a prática ao turismo de aventura ou mesmo a um perfil "natureba". Não é preciso nada disso para mochilar. Muito menos para agir como um.

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Achados da capital federal

A nossa compreensão sobre um lugar costuma ser proporcional ao número de experiências que vivemos ali. Por isso tento ficar o maior número de dias que posso em um lugar quando estou viajando. Não me importo de ficar "tempo demais", ir em locais inusitados, repetir roteiros, passar o dia "a toa" porque é esse tipo de passeio que faz com que a gente aprofunde nossa percepção sobre uma cidade, seu povo e seus costumes. Foi o que aconteceu em Brasília, já que fiquei mais tempo que o habitual e fui a lugares não muito comuns, mas que valem o passeio.

Parque Nacional de Brasília

Existem dois lugares em Brasília dos quais ninguém pode reclamar sobre a falta de árvores. Um deles é o Parque Sarah Kubitschek, o maior parque urbano do mundo (sim, do mundo, maior até que o Central Park de Nova York). O outro é o Parque Nacional de Brasília, onde passei uma bela manhã no meu último dia de viagem.

 (Banco com sombra, chamando para um pic nic depois de uma longa caminhada)

O parque, mais conhecido como Água Mineral, tem 300 mil hectares e é administrado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Dentro dele há trilhas de diferentes níveis de dificuldade, espaço para recreação e muita área verde.

 (Hora do lanche: Milho cozido e caldo de cana)

Fiz uma caminhada de 40 minutos pela trilha e me arrependi de não ter levado biquíni ou algo do tipo. Afinal, as piscinas naturais são a grande atração do parque. Elas foram formadas a anos atrás, a partir da extração de areia da região. A retirada desse material fez surgir poços d’água às margens do Córrego Acampamento. Depois que o parque foi criado (em 1961) os poços foram reformados e ganharam revestimento de pedra.

A maior tem 85 metros de extensão e é mais usada por quem pratica natação e outros tipos de atividades aquáticas. A menor também atrai os esportistas, mas faz a fama entre as pessoas que frequentam o parque a lazer. Crianças, adultos e idosos são presença garantida. Para quem tem nojo de piscinas públicas, elas são de água corrente e limpas duas vezes por semana.

(A piscina natural do Parque. A água só deixa de ser gelada depois quando o sol fica forte)

Sudoeste

A região Sudoeste não seria nada demais se estivesse em uma cidade qualquer. Ela tem prédios residenciais, ciclovias, calçadas para pedestres e um grande comércio local. Mas em Brasília isso não é tão comum. Afinal, o plano piloto, feito de forma totalmente organizada, não deixou muito espaço para comércio espontâneo, ciclovias e, em alguns locais, nem para calçadas.

O Ricardo disse que ali não tinha nada a 15 anos atrás. Ele andava de bicicleta com os amigos na região, chamada de "sujoeste" por causa do barro que acumulava depois das chuvas. Fiz uma cara de espanto: foi quase impossível acreditar que há pouco tempo aquilo não era nada. Hoje, tem muito movimento, muita gente na rua e muito, mas muito comércio. Isso porque grande parte dos edifícios tem apartamentos na parte de cima e lojas e bares na parte de baixo. Pizzaria, tapiocaria, casa de sushi, restaurante fino... tem de tudo. A noite o difícil é escolher onde ficar. O Sudoeste parece ter mais vida e, por isso, parece mais "habitável" que o resto da cidade.

Conic

Uma das primeiras vezes que vi Brasília além da sua história arquitetônica foi em um filme do Matheus Nachtergaele, durante a 12ª Mostra de Cinema de Tiradentes. Mostrava os cantos escondidos de Brasília e muitas partes do longa se passavam dentro de um edifício enorme, uma mistura de prédio residencial com comercial, cheio de corredores escuros e galerias que guardavam todo tipo de comércio, de puteiro a oftalmologista.


(Os corredores do Conic guardam lojas de tatuagem, camiseterias, clínicas odontológicas e até barbearias a moda antiga)

Esse edifício era o Conic, um prédio construído na década de 1960 e oficialmente chamado Setor de Diversões Sul - vocês não se esqueceram que quase tudo no Plano Piloto é simétrico, certo? Pois bem, o Setor de Diversões Norte, do outro lado da avenida, é o Shopping Conjunto Nacional.

(Grafiti em uma das paredes no meio do edifício)

Por influência do filme ou dos meus gostos turisticamente duvidosos, queria dar uma volta por lá de qualquer jeito. Sabia que não ia achar bonito. Talvez nem achasse graça, já que o Conic não é um lugar para se visitar, mas para frequentar. Ainda assim eu gostei de andar por ali, de descobrir lojas que eram vedadeiros achados, de ver o movimento e até de observar o mal humor dos velinhos. Para quem gosta de ver o lado B, o Conic é um prato cheio!

Encontrei um texto no site Overmundo intitulado "O Conic tem de tudo" que resume bem o espírito: Não existem palavras demais quando se fala no Conic. Nem palavras certas ou erradas. No Conic tem tudo, e tudo pode se dizer do lugar. Mas sobretudo, o Conic é um lugar feito para gente se encontrar e fazer coisas. É lugar de apropriação. É território livre e mercado comum das raças e tribos da Capital (texto completo nesse link).

(Sebo no meio do prédio: para passar horas a perder de vista)

Pontão do Lago Sul

O mais perto do mar que os brasilienses podem ir sem ter de sair da cidade é o lago Paranoá. Claro que ainda faltam a água salgada, as ondas, a areia cheia de guarda-sóis coloridos... só não falta o clima de orla de praia. Isso eles têm no Pontão do Lago Sul. O local é cheio de plantas como palmeiras e bromélias, tem uma calçada a beira do lago para caminhar, deques ao longo do caminho, lanchas que navegam pelo lago (algumas tocando música a uma altura acima do tolerável), postes de luz amarela bem baixinhos e quiosques, bares e restaurantes. Foi como estar na praia.

(Um passeio pela "orla" enquanto o sol cai)

Fui para lá exatamente para ver o pôr do sol. Não acho que estava no lugar mais bonito para esse momento, mas com certeza estava no melhor. Deitei em um dos deques e fiquei horas comendo pipoca e batendo papo furado. Durante todos os meus dias de passeio pro Brasília, não me senti tao confortável quanto lá.

(Restaurante a beira da "praia")

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Cidade Monumental - parte 2

O eixo monumental é a região mais atrativa de Brasília, principalmente para um turista. Mas dentro do próprio eixo estão dois pontos que concentram quase tudo o que um turista quer encontrar na cidade. Uma delas é a Esplanada dos Ministérios. O número de prédios de um lado é maior que do outro, pois à direita, antes de começar os ministérios, há uma série de construções importantes. A primeira é o prédio da Biblioteca Nacional, um retângulo gigante que guarda bem estruturada biblioteca pública (mas que apesar da internet wifi e das áreas como espaço para criança e sala de estudos, não tem lá muitos livros).

(Vista do Museu Nacional Honestino Guimarães, preparado para receber o festival Cena Contemporânea)

Mais a frente está o Museu Nacional Honestino Guimarães, mais conhecido como "o ovo" devido ao seu formato de iglu branco. Oscar Niemeyer fez o projeto nos anos 1970, mas o museu só foi inaugurado em 1999. A cúpula de quase 90 metros de diâmetro guarda um enorme espaço do lado de dentro, que recebe exposições temporárias, e um térreo com dois auditórios.

("200 anos das Independências em 200 retratos de escritores". Exposição - genial - do fotógrafo argentino Daniel Mordzinski) 

Logo ao lado está a Catedral Metropolitana de Brasília. Iniciada em 12 de dezembro de 1958, ela foi o primeiro monumento a ser criado na cidade. Da área circular feita no chão saem 16 colunas de concreto branco que se juntam em um certo ponto e depois voltam a se abrir, mais ou menos como uma bússola assimétrica.

Eu sempre achei a obra linda. Em primeiro lugar, pela arquitetura em si, e em segundo lugar, pela genialidade do Oscar Niemeyer em fazer um símbolo tão comum como uma igreja tomar uma forma totalmente diferente. Mas nunca imaginei que do lado de dentro ela fosse ainda mais bonita. Apesar de parecerem pretos do lado de fora, os vidros que recobrem a Catedral formam um mosaico branco, azul e verde quando a luz do sol bate.

(Belo por dentro e por fora)

Agora uma curiosidade que não sei se todos sabem: experimente ficar no fim de uma das paredes circulares da Catedral e coloque um amigo do outro lado. Então, converse com ele em tom normal. Apesar da enorme distância, o som chega até o outro lado sem dificuldade, devido à acústica do local.

Caminhar pela Esplanada dos Ministérios pode ser um trabalho árduo pois o sol não descansa nunca e as árvores não ajudam. Mas o conjunto da obra vale a pena. No caminho, prédios super interessantes como os palácios da Justiça e Itamaraty compõem a paisagem.

(O Ministério das Relações Exteriores, mais conhecido como Palácio do Itamaraty)

Lá na frente, o imponente Congresso Nacional. Não sei se alguém já fez um ranking das construções de Niemeyer e na verdade pouco me importa: para mim, essa é a obra máxima da sua carreira. Ela não é a mais bonita, mas é a que apresenta um maior simbolismo.

(Obra prima de Niemeyer é símbolo maior de Brasília)

O Congresso Nacional pode ser visitado todos os dias, de 9h30 às 17h. E para dar mais informações aos turistas (ou para impedir que as pessoas transitem com liberdade pelo local) as visitas são guiadas e acontecem de 30 em 30 minutos.

Niemeyer desenhou o Congresso para que ele de fato representasse a forma como o Brasil é governado. A semiesfera do lado esquerdo é o assento do Senado e ela está virada para baixo pois os senadores não são eleitos pelo povo. A semiesfera do lado direito é a Câmara dos Deputados e está virada para cima pois é o povo quem escolhe seus líderes, que têm de estar abertos à população. O tamanho de cada uma das copas também representa simbolicamente o número de políticos que compõem cada uma das partes. No meio, dois prédios de 28 andares com onde funcionam a administração das duas casas legislativas, conectados por uma passarela.

(Senado e Câmara dos Deputados. Em tempo de reforma, é férias pra todo mundo. Espertinhos eles, não?)

Durante a visita, dois pontos chamaram mais atenção. O primeiro é um túnel do tempo com painéis de todos os senadores do Brasil, desde 1822. Entre os achados estão reproduções de pinturas históricas, como a da Princesa Isabel recebendo o título de primeira senadora do país, e fotos da inauguração do Congresso Nacional.

Outro ponto interessante é o Salão Verde, um espaço de convivência cheio de obras de arte como o painel azul e branco de Athos Bulcão, intitulado Ventania. Para fazê-lo, Athos escolheu 4 tipos de azulejo e pediu aos operários que construíam o local para dispor as cerâmicas desordenadamente, de forma que azulejos parecidos não ficassem perto um do outro. Outro aspecto que vale a pena observar é a estante que fica a direita de quem entra no salão. Ela guarda os presentes que as comissões internacionais doam ao brasil sempre que vão visitar a sede do governo da capital. Entre as obras estão pratos, esculturas e joias.

Atrás está a Praça dos Três Poderes, um amplo espaço aberto entre o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal, edifícios que correspondem aos poderes legislativo, executivo e judiciário, respectivamente. A praça tem atrações interessantes como o Espaço Lúcio Costa, que guarda uma maquete em escala real do plano piloto de Brasília. O Panteão da Pátria, construído para abrigar restos mortais de figuras ilustres para a política nacional, também seria um desses locais... se estivesse aberto. De toda forma, do alto da pira dá para se ter uma vista interessante da Praça.

(Ao fundo, o Panteão da Pátria, ao fundo, e em primeiro plano, a escultura Os Candangos, de Bruno Giorgi. A peça é uma homenagem aos mais de 80 mil trabalhadores, os verdadeiros responsáveis por Brasília)

O último ponto do eixo monumental é o Palácio da Alvorada. A construção está bem distante das outras e, pensando friamente, não vale a visita. Há uma distância máxima na qual o visitante pode se aproximar que não deixa ver absolutamente nada além do lindo edifício de três andares no qual reside o presidente do Brasil. Na verdade, eu concordo com essa atitude, pois abrir o espaço ia interferir na privacidade dos moradores (imagine sua casa sendo invadida por bandos de turistas de hora em hora...). Acabei indo até lá pois sempre tive a curiosidade de ver a obra com meus próprios olhos - e, quem sabe, ver a Dilma Rousseff dando umas voltinhas pelo gramado.

(Palácio da Alvorada e a imensidão sem curvas do Planalto Central)

A linda mansão está às margens do Lago Paranoá e tem um terreno de 36 mil m², 8 quartos, obras de arte, heliponto, capela, campo de futebol, piscina olímpica, espaço com churrasqueira e bar. A vigilância 24 horas conta ainda com um guarda fardado, ao melhor estilo inglês, sempre de prontidão. Depois de ver um espetáculo arquitetônico inteiramente nosso, fica duro de engolir aquele guardinha-estilo-exportação.

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Cidade monumental - parte 1

Na capital federal, o dia sempre começa com sol e céu azul. Não sei o que acontece, mas o azul de Brasília é mais azul que o normal. Talvez seja o fato de a cidade ser plana e fazer com que a gente observe o céu com mais frequência. Basta olhar pra frente. O que importa é que ninguém precisa se preocupar com o tempo se for à Brasília no inverno pois o clima vai estar sempre agradável.

(No finalzinho da tarde já começam a aparecer as nuvens. O azul anil permanece intacto)

Assim amanheceu a cidade em todos os dias em que estive lá. A parte ruim é que num dia lindo desses fica difícil passear por causa do calor. A parte boa é que meu amigo estava na cidade e pegou o carro emprestado com o pai. =P

Ele me explicou que não há muito o que fazer nas asas norte e sul, pois são áreas residenciais. Assim, ficaríamos basicamente no outro eixo. Propositadamente ou não, Lúcio Costa imitou até as funcionalidades de uma aeronave na hora de planejar Brasília, já que a maior parte das atrações, dos pontos turísticos e dos locais que realmente movem a cidade estão no corpo do avião, conhecido como eixo monumental - o que ele de fato é.

Em direção à cabine de comando

Edifícios de geometria elaborada, pouco rebuscados, pintados de branco. O eixo monumental guarda todas aquelas construções características de Brasília. Basicamente, a arquitetura que caracteriza o próprio Oscar Niemeyer, autor de grande parte das obras. A primeira construção no sentido oeste-leste é a Igreja Rainha da Paz. Inaugurada em 1994, ela foi feita em formato de barraca de campanha. Por fora, a igrejinha é encantadora. Por dentro... nem tanto. Ela é bastante comum, com exceção do teto cheio de fios e luminárias redondas nas postas que eu queria fazer igual na sala da minha casa.

(Igreja Rainha da Paz por dentro e por fora)

Ali perto está o setor militar, um bairro de Brasília onde ficam os quartéis do exército brasileiro. Ao contrario da igreja, todas as construções do setor são grandiosas. A que mais chama a atenção é o palanque monumental, conhecido como Cúpula da Espada de Caxias, no qual acontecem as grandes paradas e anúncios oficiais. O espaço tem aquela "aura de poder". Até o teto foi projetado para isso: qualquer palavra, palma ou mesmo passo, cria um eco gigante. Motivo mais que suficiente para brincar embaixo da cúpula - a despeito do guardinha que tomava conta do local.

(Cúpula gigante)

Mais a frente está o Memorial JK. Para quem não sabe, Brasília é um misto do pensamento organizacional de Lúcio Costa e do design artístico de Niemeyer. Mas nada teria acontecido se não fosse o louco do Juscelino Kubitschek. Afinal, todo visionário é taxado de louco.

Assim que assumiu a presidência do país, em 1956, deu início às obras que transformariam o interior de Goiás na capital do Brasil. O principal objetivo da obra era interiorizar a capital federal, necessidade descrita na própria constituição. Claro que Juscelino também lembrou que, dessa forma, teria algo grandioso para marcar seu nome na historia do Brasil. Assim se deu Brasília, que desde 1960, quando foi inaugurada, presta homenagem ao seu idealizador em nomes de ruas, edifícios, estátuas e museus.

("Tudo se transforma em Alvorada nesta cidade que se abre para o amanhã", placa com frase de Juscelino Kubitschek, em frente ao memorial)

O memorial é uma homenagem. A maior delas, no caso. É um espaço dedicado exclusivamente ao ex-presidente. A praça é composta de um museu, uma estátua de JK com sua esposa e outra estátua feita em bronze em que Juscelino acena para a cidade, como a dar um "oi" aos seus cidadãos, do alto de uma armação de ferro. Ela é bem imponente e se transformou em cartão postal da cidade (mas antes disso recebeu críticas de pessoas que viam ali representações da foice e do martelo, símbolos do comunismo de Oscar Niemeyer).

 (Juscelino e Sarah. Eternizados na história nacional)

Paradoxalmente, um dos locais que mais gostei de ir não é bonito, grandioso ou monumental. Assim é a torre de TV, que apesar de feia, funciona como um mirante. O elevador (gratuito) leva os visitantes a um espaço aberto com uma vista de 360º da cidade. Dá para ver absolutamente tudo lá de cima. Logo a frente, o Conjunto Nacional e o Conic, espaços de convivência da população, a Praça dos Três Poderes, a Esplanada dos Ministérios. Do outro lado, o estádio Mané Garrincha, em reforma para a Copa 2014, a Feira da Torre, o Parque da Sarah Kubitschek. De cada lado, os lindos prédios das asas norte e sul. A torre é um local para se perder tempo.

(Vídeo - tosco, mas sincero - com vista panorâmica da torre da TV)

E parece que para compensar a construção antiga que, o governo resolveu fazer outra torre de TV. Dessa vez, projetada por Oscar Niemeyer. O projeto se chama "Flor do Cerrado". As pétalas são cúpulas de vidro: em uma delas há um espaço de exposição e na outra um bar/café que ainda não está em funcionamento. A torre com 180 metros de altura foi inaugurado em 21 de abril desse ano e já se tornou no novo ponto turístico da cidade.

(Segunda foto da Anna Bárbara, do blog Nós no Mundo. Nesse link ela fala um pouco mais sobre a Torre de TV Digital de Brasília)

A Torre fica bem afastada do centro e para ir lá é preciso um carro. Mas atenção aos desavisados: o local só funciona aos sábados, domingos e feriados, de 9h às 17h. A visitação é gratuita.

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Impressões sobre Brasília

Brasília sempre foi um ponto de interrogação na minha cabeça. Em primeiro lugar, porque cada um tem uma opinião diferente sobre a cidade. Bonita, feia, grande, pequena, palco de transformações políticas, espaço inócuo... ninguém sabe ao certo. Em segundo lugar, porque as opiniões das quais as pessoas concordam são feitas puramente de esteriótipos. E eu não acredito em esteriótipos (ao menos que eles sejam meus =P).


Finalmente conheci a capital do país e tive a oportunidade de passar todas essas questões a limpo. Durante a viagem, conversei com brasilienses e turistas sobre a cidade, sem saber ao certo se as minhas impressões seriam as mesmas até o último minuto. Ao repassar melhor todas as experiências e ver as fotos que tirei, posso dizer algumas coisas.

Brasília é incrível. Em quatro anos, aquele deserto, seco, totalmente plano, se transformou em uma cidade com recursos e serviços suficientes para assegurar a vida de milhares de pessoas. Claro que a construção da capital federal trouxe outra série de problemas (como dívidas públicas, deslocamentos forçados e expulsão de grupos indígenas). Ainda assim, eu me assusto ao pensar que em 62 anos de vida a cidade passou de alguns povoados para 2,5 milhões de habitantes.

(A maquete vista de frente. Aqui perto, a cabine do piloto. Ao fundo a cauda do avião. Dos lados, as asas)

Outro fator que me deixou admirada é o planejamento urbano. Brasília é a cidade mais organizada que já conheci na vida. Para quem não é muito bom com mapas (como eu) vá no Espaço Lúcio Costa, na Praça dos Três Poderes e gaste pelo menos meia hora observando a maquete do Plano Piloto. O corpo do avião, conhecido como Eixo Monumental, guarda as principais obras arquitetônicas da cidade. Nas asas, conhecidas como Eixo Rodoviário, estão os bairros nobres. E apesar das separações, tudo é simétrico: o número de ruas, o número de quadras, os tamanhos das quadras, a quantidade de edifícios em cada uma dessas partes... O planejamento está até no nome das ruas, que trazem números ao invés de flores da Amazônia ou de generais que não conhecemos. Apesar de os nomes dos quarteirões parecerem placas de carro, eles são muito mais inteligentes pois identificam matematicamente onde a pessoa se localiza.

(O resultado tão almejado por Lúcio Costa, visto da torre de TV bem no centro do Eixo Monumental. Simetria perfeita)

A única parte confusa é o funcionamento do governo local. Lembro que passei bons minutos com meu amigo tentando descrever Brasilia. O que ela é? Capital, município ou cidade? O que poucos sabem é que o Distrito Federal não tem municípios, mas sim regiões administrativas, e apesar de Brasília ser uma cidade, ela não é gerida por um prefeito, mas por um administrador. Só se vota de 4 em 4 anos, no governador do DF que, por sua vez, escolhe o administrador.

Brasília é um espetáculo arquitetônico. E essa afirmação está acima de qualquer suspeita. Ela é moderna e ousada, e vai continuar assim por muito tempo. O Congresso Nacional, o Palácio da Alvorada e até o sino da Catedral são diferentes de tudo o que existe no mundo. É a marca maior de Oscar Niemeyer. Com razão, Brasília é considerada patrimônio da Humanidade pela Unesco.

(Brasília é um delírio para os amantes da arquitetura. Do monumento a JK ao Pombal da Praça dos Três Poderes)

Ela é também a única cidade do Brasil com potencial para ser de primeiro mundo. Por quê? Ela tem espaço. Espaço para construir novas casas, novos edifícios, novas pistas de trânsito. Espaço para implementar metrôs e ciclovias. Pena é ver que o governo não dá a mínima pra isso pois não consegue nem impedir o tráfego intenso na hora do rush...

Geograficamente falando, Brasília é a personificação do Cerrado. Poucas árvores, de tamanho médio, espaçadas. Vez ou outra, viajando pelo Sudeste de carro, via essa paisagem, mas o mais comum era ver árvores típicas do cerrado em grande quantidade, com muitos galhos e folhas fazendo sombra... uma floresta mesmo. Em Brasília eu tive certeza que as fotos de Cerrado que os livros de Geografia tiram são da região centro-oeste.

(Sem mais...)

Inclusive, quando disse que Brasília tinha poucas árvores quiseram me matar. Desculpa mas sim, tem poucas árvores. E o pior é que elas tem poucas folhas e não fazem sombra. Por isso é tão difícil caminhar na capital: não existem áreas de respiro pois os quarteirões são gigantes e as plantas não são o suficiente para dar aquela refrescada. Por falar em clima, Brasília tem uma das maiores amplitudes térmicas que já vi. Você sua desgovernadamente pela manhã, de short e blusa curta, e treme de frio a noite, mesmo de casaco. E isso não acontece um dia só, mas o inverno inteiro.

(Essa é mais ou menos a imagem que me vem a cabeça quando penso em "impessoalidade")

Mas acima de tudo, Brasília é uma cidade impessoal. Alguns fatores: o concreto tomou conta da cidade. Tudo é cinza e o céu, azul, é o único responsável por colorir a paisagem. Grande parte da população tem carro. As pessoas não andam nas ruas. A organização excessiva acabou com o a beleza do caos. Essa tal impessoalidade é algo que difícil retratar pois é menos um fato e mais um sentimento... Em resumo, Brasília não parece ter sido feita por pessoas.

Mas a noite tudo se transforma. Participei da abertura da Cena Contemporânea 2012, ao lado do Museu Nacional Honestino Guimarães, mais conhecido como "o ovo", e parecia estar no meio de um evento internacional. Tinha gente de tudo que é jeito. Brasília é um fruto da migração nacional. O fato de pessoas de todas as partes do país terem abandonado suas casas para morar na capital federal fez a cidade se tornar um colagem do povo brasileiro.

(DJ Donna animando uma das noites na capital Federal. Foto de Miguel Mello, tirada desse link)

A noite, a impessoalidade dá espaço a diversidade Cabelos coloridos, de todos os tamanhos, semblantes diferentes, sotaques de todas as partes do país. Ninguém ali parecia ter saído do mesmo lugar. E cada um fazia o que estava afim: conversava, bebia, dançava do jeito que bem entendesse. Belo Horizonte também é uma capital, mas aqui tem um clima meio interiorano e as pessoas ainda se importam com o que o coleguinha ao lado está pensando do outro. Em Brasilia não tem nada disso. Eu fiquei admirada.